Análises
Bitcoin é mais um mecanismo de troca que uma moeda
O Bitcoin surgiu em 2008 com a publicação de um paper lançado pelo desconhecido Satoshi Nakamoto, onde ele nomeia a invenção como um sistema de pagamento Peer-to-Peer (P2P) e não exatamente como uma moeda. Ao contrário do que vimos ao longo da última década, onde muitos nomearam o Bitcoin como uma moeda. Embora este conceito não estivesse presente no paper original.
Bitcoin é dinheiro?
Para ser dinheiro ele deveria ser aceito por todos. Nesse sentido, a resposta é que não é dinheiro, portanto. Embora o Bitcoin possa ser trocado por praticamente qualquer moeda fiduciária, certamente não está sendo aceito por todos. Há experiências em curso, onde se pode pagar viagens e hotéis com Bitcoin, mas ainda estamos falando de algo muito restrito para ser nomeado como algo ‘universalmente aceito’, como o dinheiro propriamente.
Embora existam algumas empresas e corporações que aceitam bitcoin como forma de pagamento, a grande maioria da população mundial não aceita e certamente, nunca irá aceitar. Visto que as transações não são instantâneas e o preço do Bitcoin oscila demais para servir como meio de pagamento corriqueiro, mas funciona como ativo financeiro e instrumento de especulação. Sua valorização durante todo o ano de 2020 é impressionante:
Como a jornada do Bitcoin em direção ao mainstream continua avançando, é importante tentar descobrir como o mundo vê a maior criptomoeda. Com isso em mente, aqui estão algumas perguntas muito importantes a serem feitas: O que é o Bitcoin? É uma moeda? Uma forma de dinheiro? Uma reserva de valor? Todas as opções acima ou nenhuma delas? Talvez algo completamente novo?
O Bitcoin está mais próximo dos ativos financeiros e menos próximo do dinheiro propriamente.
O Bitcoin como mecanismo de troca
O dinheiro é um meio de troca, por definição simples e direta; permite que as pessoas transacionem entre si e obtenham assim, bens e serviços. Como o ouro e outros metais preciosos, o dinheiro vale porque, para a maioria das pessoas, representa algo valioso. Então a partir dessa premissa, por que o Bitcoin não pode ser considerado dinheiro?
A questão aqui reside no conhecimento popular e na adoção. Se o Bitcoin fosse mais conhecido e universalmente aceito, ele poderia funcionar como dinheiro.
O que distingue o Bitcoin como “dinheiro” e a moeda de curso forçado, como o dinheiro oficial é classificado pelo nosso Banco Central (Bacen), por exemplo, é o fato de que o ativo que está sendo negociado, é liquidado por um “mecanismo de troca”, isto é, o método ou processo pelo qual o ativo é transferido de uma mão para a outra (liquidação da operação). Isso revela que o dinheiro com propriedades semelhantes ao Bitcoin já existe há séculos, porque por design o Bitcoin também pode ser usado para um pagamento de um bem ou serviço. No entanto, a capacidade de se realizar transações eletrônicas sem uma parte confiável – uma característica definidora do Bitcoin – é radicalmente nova e dinheiro nenhum no mundo conseguiu superar até então.
O Bitcoin não é uma nova classe de dinheiro, é um novo tipo de mecanismo de transação e esse tipo de mecanismo pode suportar uma variedade de formas de dinheiro, bem como outros tipos de ativos. Daí o surgimento de outras criptomoedas.
Os estudiosos do tema, Tobias Adrian e Tommaso Mancini-Griffoli, economistas do Fundo Monetário Internacional (FMI), categorizam as criptomoedas como um tipo de dinheiro em um estudo publicado pelo FMI.
Não é incomum que o Bitcoin e as criptomoedas sejam descritas como um novo tipo de dinheiro. No Relatório Econômico Anual de 2018 divulgado pelo Bank for International Settlements (BIS), eles “avaliam se as criptomoedas podem desempenhar algum papel como dinheiro”. E a resposta é: o Bitcoin não é dinheiro, mas pode ser usado como mecanismo de troca e também pode atuar ao mesmo tempo como plataforma de remessas internacionais, substituindo o SWIFT,
Novos mecanismos de troca para competir com o Bitcoin
Os bancos sentirão a pressão do dinheiro eletrônico, principalmente que mecanismos de pagamento mais eficientes, como o PIX, no caso brasileiro, entrarem em ação e forçarem a adoção do dinheiro digital. Segundo rumores, o Bacen enxerga espaço para o lançamento de uma versão digital do real em breve.
No entanto, os formuladores de políticas devem estar preparados para alguma perturbação no cenário bancário, como tem sido o caso das Fintech’s que tiveram um crescimento expressivo nos últimos anos, ameaçando a hegemonia dos grandes bancos, no fornecimento de contas bancárias sem custo. Esses novos participantes da arena de sistemas de pagamento podem um dia se tornar os próprios bancos e oferecer crédito direcionado com base nas informações que eles têm adquirido.
É improvável que o modelo bancário desapareça. Mas o que se vislumbra é uma convivência híbrida entre os grandes bancos, os detentores de grandes reservas de dinheiro e, portanto, financiadores de grandes operações de crédito, e as fintech’s, coexistindo dando acesso ao sistema financeiro aos pequenos correntistas.
Os bancos centrais desempenharão um papel importante na moldagem desse futuro. As regras que eles definem terão grande influência na adoção de novos dinheiros digitais e a pressão que estes exercem sobre os bancos comerciais.
Uma solução é oferecer a novos provedores de dinheiro eletrônico acesso a reservas do banco central, embora sob condições estritas. Como está sendo o caso do PIX, diversas outras instituições terão que usar a estrutura dos grandes bancos, para fazer uso do mecanismos de pagamento do PIX.
Para Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central do Brasil (Bacen), o lançamento do PIX significa um processo de modernização do dinheiro, na qual está incluso a emissão de dinheiro digital, o mecanismo de pagamento e no futuro um sistema de remessa internacional.
A entrada em cena das moedas soberanas digitais
Todo esse cenário está sendo desenhado para o lançamento da “Moeda digital do banco central” (CBDC), uma versão digital de dinheiro que muitos bancos centrais ao redor do mundo estão preparando para lançar, em destaque a iniciativa chinesa.
Ao pintar essas perspectivas, destaca-se que há muitas perguntas que ainda precisam de respostas antes que políticas concretas possam ser elaboradas. Afinal esses CBDC’s serão emitidos baseados em que lastro? Terão emissão infinita? Poderá se criar versões sintéticas destes?
Por enquanto há mais perguntas que respostas.
Empreendedor, Cientista de Dados e cryptopesquisador.