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Reservas fracionárias com Bitcoin

O que é a moeda?

A moeda é um meio de troca que possui as características de ser universalmente aceito, escasso, infalsificável, divisível e fácil de transportar. Além disso, deve servir como reserva de valor e unidade de conta.

A história da moeda

Antes de entender o que é um sistema de reservas fracionárias, é necessário compreender brevemente a história do dinheiro. Ao longo da história da humanidade, as pessoas passaram a cooperar em uma divisão de trabalho para produzir bens, com o passar do tempo, o processo produtivo passou a se tornar cada vez mais detalhado e as pessoas se especializavam em tarefas cada vez mais específicas, até que começassem a surgir os ofícios, ou profissões.

Como consequência disso, passaram a surgir bens com propósitos diferentes e ordem de complexidade diferentes. Diante disso, a troca direta entre duas pessoas que querem trocar dois bens passou a se tornar cada vez mais difícil. Para ilustrar, deve-se recorrer a um exemplo simples: suponha que em uma economia exista dois bens (sapatos e agasalhos), duas pessoas podem estimar uma taxa de câmbio e trocar diretamente seus 2 pares sapatos por um agasalho, esta é uma troca simples e direta, pois envolve dois bens finais e não houve nenhum meio de troca a não ser os próprios bens.

Agora imagine que essa economia passe a se tornar mais complexa e que agora a mesma tenha 3 bens (sapatos, agasalhos e carne). Imagine que duas pessoas desejam trocar, uma possui sapatos e deseja agasalho, a outra parte possui agasalho mas deseja carne, desta forma, a troca direta não acontecerá. Será necessário encontrar alguém que deseje trocar carnes por sapatos, depois disso será necessário trocar carne por agasalho, agora adicione mais bens e mais pessoas dentro do contexto econômico, as trocas diretas ficariam impossíveis de ocorrer.

Dentro desse contexto surge o meio de troca, que passa a ser utilizado como moeda. Alguns bens são mais vendáveis dentro de uma economia do que outros bens, por exemplo, o trigo é mais vendável do que um instrumento de astronomia, assim como o couro é mais vendável do que um arado. Estes bens são escolhidos gradativamente de acordo com as suas características que facilitariam a troca indireta entre duas pessoas, inicialmente foi escolhido o trigo, algumas sociedades utilizavam carne, couro, lã, até que se chegou nos metais preciosos como Ouro, Prata e Bronze.

As características que todo bom meio de troca deve ter são: ser um meio de troca universalmente aceito, fácil de transportar, escasso e difícil de falsificar. Os metais preciosos preenchiam todas estas características quase à perfeição, e por conta disso, surgiram as primeiras moedas cunhadas a partir de metais preciosos. Agora as trocas indiretas são possíveis dentro de todo âmbito da sociedade, permitindo que a economia se desenvolva, pois agora a divisão de trabalho se torna mais evidente, as pessoas se especializam mais nas tarefas, e a produtividade do trabalho aumenta.

As moedas de metais preciosos são muito escassas, por conta disso, surgiu a preocupação com a segurança, pois negociar grandes quantidades de ouro passava a ser perigoso, pois as moedas passavam a ser alvo de roubos. Assim, começaram a surgir as casas de custódia, onde se depositava o ouro e ganhava em troca um certificado de “vale x onças de ouro”, também conhecido como moeda-papel, que agora poderia ser utilizado em trocas.

As casas de custódia começaram a perceber que nem todas as pessoas sacavam o seu ouro ao mesmo tempo, em função disso, começaram a emitir certificados sem lastro em ouro e cobrar taxas de juro por empréstimo, surgindo assim o sistema de reservas fracionárias. Há muitas indagações sobre a moralidade deste sistema, as quais não iremos discorrer neste artigo. Mais precisamente, o sistema de reservas fracionárias consiste na prática de emitir moeda-papel sem ter necessariamente um lastro para estas moedas.

As casas de custódia evoluíram para os bancos, que agora passavam a custodiar ouro, os bancos passaram a incorporar outros bancos menores por meio da competição interbancária. A partir deste ponto, surgem os grandes bancos centrais ao redor da economia mundial, com o passar do tempo os bancos centrais ganham o monopólio da emissão de moeda em cada país, além de ficarem com a custódia de todo o ouro. As moedas ainda eram lastreadas em ouro e prata, de forma que um cidadão poderia solicitar o resgate a qualquer momento.

Com o passar do século XX, a moeda vai perdendo cada vez mais a sua ligação com o ouro, até que com o fim do Acordo de Bretton Woods, o lastro com o Ouro se perde completamente, surgindo assim as “moedas fiduciárias”, as quais possuem seu lastro garantido pelo governo.

O problema da reserva fracionária

Vamos supor que o Banco X tenha US$10 de depósitos em caixa, e que ele passe a emprestar US$30. O dinheiro necessário para realizar os empréstimos, no caso os outros US$20, são criados a partir do nada porque não há fundos o suficiente para estes empréstimos, o banco simplesmente digita números na conta corrente dos tomadores de empréstimo. O banco adiciona em seu ativo um empréstimo no valor de US$20, e um valor de US$20 em seu passivo, no entanto, o seu patrimônio líquido ainda se mantem em US$10, esta prática é conhecida como alavancagem, quando o banco empresta mais do que o seu patrimônio.

O problema desta prática de reserva fracionária é que se todos os clientes resolverem sacar o seu dinheiro, inevitavelmente ocorrerá uma catástrofe no banco, o levando imediatamente à falência. Agora imagine um sistema financeiro com centenas de bancos realizando esta prática? Em um cenário de crise ou guerra, as pessoas começariam uma corrida aos bancos e imediatamente todos os bancos abririam falência, com muitas pessoas perdendo o seu dinheiro, consequentemente levando a uma crise mundial, como ocorreu no grande crash de 1929.

Para que isso fosse evitado, surgiram diversos acordos internacionais como “Basileia”, no qual foi estabelecido um limite no qual os bancos poderiam praticar o sistema de reservas fracionárias e um mínimo de liquidez que os bancos deveriam manter sobre o seu capital antes de realizarem empréstimos. No entanto, isso não vem sendo o suficiente, uma vez que o problema está no próprio sistema de reservas fracionárias, que simplesmente permite que os bancos criem dinheiro a partir do nada.

É possível ter um sistema de reservas fracionárias com Bitcoin?

Para analisar esta possibilidade, primeiramente é necessário realizar uma breve comparação entre o Bitcoin e o ponto em que começou a ser praticado o sistema de reservas fracionárias, que foi a custódia de ouro em casas de custódia. O ouro é um bem que possui características quase idênticas as do Bitcoin, ele é facilmente divisível até que se chegue a um limite físico, fácil de transportar em pequenas quantias, escasso e aceito universalmente.

No entanto, a partir do momento em que o montante de Ouro passa a ser de um volume considerável e considerado de alto valor, surgem os empecilhos: a segurança e os custos que envolvem o seu transporte. O Bitcoin é naturalmente mais seguro e fácil de transportar que o Ouro, podendo ser transacionado entre duas pessoas de qualquer lugar do mundo. Logo, não faz muito sentido a criação de casas de custódia de Bitcoin, e tão pouco a emissão de “Vale Bitcoin”, pois ele já serve para transacionar de maneira segura e fácil, mesmo que seja em grandes quantidades.

As corretoras de Bitcoin podem criar um sistema semelhante de reservas fracionárias, no qual seus clientes negociem com empréstimo, no entanto, com o alto risco deste tipo de operação, as corretoras tenderão ao conservadorismo e limitarão este tipo de operação a um certo nível de volume. Há até a possibilidade de serem criados Bancos de Bitcoin que ofereçam soluções de segurança para o armazenamento da moeda, no entanto, isso confronta o propósito do Bitcoin, que é o da possibilidade de as pessoas serem os seus próprios bancos, pois é um sistema seguro para ser mantido por qualquer pessoa.

Caso os bancos de Bitcoin, em um cenário de competição interbancária, passem a praticar reserva fracionária, será estabelecido naturalmente um limite, pois os bancos que detêm o maior número de “Vale Bitcoin” podem solicitar o saque de bancos menores, levando-os à insolvência. Desta forma, os bancos tenderiam a adotar o conservadorismo da adoção de reservas fracionárias, praticando-a em um pequeno volume que não seja prejudicial à sua saúde financeira caso ocorra uma corrida bancária.

Além disso, há outra possibilidade: os governos poderiam passar a lastrear a sua moeda no Bitcoin. Como nenhum governo consegue exercer controle sobre o funcionamento do Bitcoin, eles tentariam exercer controle sobre o preço ao comprar grandes quantidades no open-market, e tornar a criptomoeda uma reserva internacional, desta forma os governos passariam a imprimir moeda lastreada em Bitcoin a uma paridade de 1 BRL = 1 Sat (Satoshi), no entanto, isso não seria praticável visto que moeda é extremamente escassa, sendo necessário recorrer novamente ao sistema de reservas fracionárias. Sem contar que a moeda tenderia ser extremamente inflacionária, uma vez que os governos podem emitir livremente moeda e forçar o seu curso através da legislação.

Como o Bitcoin já é uma moeda mais eficiente do que as moedas fiduciárias, não faria sentido o governo lastrear a sua moeda, pois os agentes econômicos preferem entesourar as moedas menos inflacionárias e de melhor qualidade. Desta forma, a sociedade passaria a perceber que a moeda estatal não possui valor nenhum, e iriam querer sacar os seus Bitcoins, gerando uma corrida ao Banco Central, colapsando o sistema monetário estatal, até que o governo corte completamente o lastro, como ocorrido em Bretton Woods.

Conclusão:

Seria possível com que instituições financeiras (bancos centrais e grandes bancos) e até Exchanges pratiquem o sistema de Reservas Fracionárias, no entanto, as próprias características do Bitcoin tornariam este sistema ultrapassado, uma vez que não há propósito para a sua implantação. Porque o Bitcoin surgiu como uma tecnologia disruptiva que tem o objetivo de entregar às pessoas a liberdade financeira e acabar com a necessidade de grandes bancos custodiando o seu dinheiro. Além disso, o próprio Bitcoin já serve como uma moeda perfeita, diferente do ouro que possuía limitações que impediam muitas vezes a transação de ocorrer.

Há o fato de que as pessoas preferem ter uma moeda deflacionária, desta forma, não haveria sentido econômico e racional para que elas abdiquem os seus Bitcoins, que é uma moeda escassa, deflacionária, descentralizada e anônima, em troca de uma moeda centralizada, inflacionária e controlada por uma entidade governamental que pode controlar a sua oferta a qualquer momento.

Empreendedor, Cientista de Dados e cryptopesquisador.

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